tomanotas

aliviar o peso e preservar as memórias

quando se torna um desempregado, você precisa repensar os seus gastos. o processo tende a ser indigesto, mas pode render surpresas, como a que tive ao fazer o downgrade da assinatura de um serviço.

hoje, quase tudo meu está na nuvem. a solução é boa, mas tem o seu preço. pra reduzir a minha dependência dela e poupar um pouco, decidi editar e subir os vídeos que tinha no telefone pro youtube – em modo privado, claro –, o que me permitiu liberar espaço no celular e, ao mesmo tempo, economizar uma grana gasta em armazenamento.

apesar de trabalhosa e até meio arriscada, essa movimentação fez com que eu revisitasse memórias que estavam esquecidas num canto remoto do telefone e, mais importante, as tornasse compartilháveis.

talvez não pareça, mas esse exemplo dialoga com um desejo que romantizo há alguns anos: o de fazer a vida caber numa mochila, de ter e carregar cada vez menos coisas materiais comigo.

a ideia surgiu quando li pela primeira vez o relato de um nômade digital, um cara da área de tecnologia que vivia com o mínimo. achei libertador, isso de não ter quase nada pra levar nas costas e deixar como rastro. soa melancólico, eu sei, mas me parece catártico, também, pensar uma existência econômica à moda de dias perfeitos.

afinal, se nem eu estou disposto a lidar com o sobrepeso da minha materialidade, por que deveria submeter as pessoas que amo ao mesmo processo? deve ser de uma conveniência absurda, essa leveza.

talvez haja algo de trauma aí, eu sei. nos últimos anos, encarei mudanças que me obrigaram a me despojar de repente de objetos de que eu gostava muito. meus livros, por exemplo: três bota-foras, já.

seja como for, a cada dia me atraio mais pela ideia de não possuir.

hoje me despeço das coisas quase sem culpa, especialmente se elas estiverem esquecidas no fundo do armário. o cansaço e o amadurecimento têm me ajudado a entender que a materialidade não define o peso real das nossas memórias, e que tudo vai seguir sendo como é mesmo que eu leve pouco (ou quase nada) no caminho.

às vezes, um downgrade forçado cai bem.

#anotação #materialidade #memória